
Chronica
SUMO
Devia ser o cheiro de Neide, era um cheirinho doce, enjoado, quando eu estava de barriga vazia chega embrulhava o estômago.
Sempre mirradinha, desde que nasceu.
Mamãe era boa parideira, ancas largas, pele grossa; aos 47 anos, nove filhas, nem por reza brava veio um homem, e olha que fiz ate novena pra que a última barriga fosse macho; dava jeito não, nove meninas, eu, a mais velha.
Meu pai morreu pouco depois de me ver nascer. Foi o velho Tião, na traição; dois tiros nas costas... matou pra ficar com mamãe; ela, de bom grado aceitou.
Quando eu fiz dez anos, Tião me tocou, me mostrou que o bicho homem é, dos animais, o mais terrível.
Chorei, vomitei a casa toda, chamei mamãe e contei tudo, mas a morada era boa demais.
"Fica boazinha, ele não vai mexer mais em você..."
Então, agora, mamãe era Dona Vilma, a vagabunda mais puta de toda e qualquer esquina.
E depois de mim, foi a Clarisse.
"Fica boazinha, ele não vai mexer mais em...”.
Depois de Clarisse, foi Aninha.
"Fica boazinha, ele não vai mexer mais..."
Depois de Aninha, Carol.
“Fica boazinha, ele não vai mexer ..."
Depois de Carol, Vânia.
“Fica boazinha, ele não vai ..."
Depois de Vânia, Maria.
“Fica boazinha, ele não...”.
Depois de Maria, Antonieta.
“Fica boazinha, ele ..."
Depois de Antonieta, Paula.
“Fica boazinha..."
Depois de Paula, Neidinha.
Fica em paz, Neide... Tião e Dona Vilma há de mexer com mais ninguém das meninas.
Dois tiros no peito de cada um; sou de atirar pelas costas, não.
Viviane Santyago
[13/09/2017]